quarta-feira, 19 de julho de 2017

A incapacidade mental da adolescência II

Hoje vou contar-vos a história de quando fui atirar ovos à casa das vizinhas… Eu disse que podia ser pior…
Neste episódio podemos contar com a participação dos três cromos da última aventura juntamente com outros quatro mentalmente incapacitados adolescentes. Para facilitar e, ao mesmo tempo, manter uma certa privacidade, irei identificar cada um dos participantes pela inicial dos seus respetivos nomes.
Tarde de sol, seis jovens passeiam calmamente pelas ruas de Ponte de Sor – quatro rapazes e duas raparigas – até que um deles se lembra de começar a correr, saltar, agarrar-se a um poste de sinalização e rodar nele como se de uma stripper profissional se tratasse (obviamente estou a satirizar, a ideia era parecer o Rey Mysterio, da WWE). Como imediatamente pudemos constatar, o poste não se encontrava nas melhores condições e partiu-se. Querem tentar adivinhar quem foi este artista? Não é difícil… foi o mesmo que tocou à campainha e fugiu, desencadeando todo o episódio anterior. Um cidadão civilizado, portanto. Podemos chamar-lhe R.
Poste partido nas mãos do R, ficámos todos a olhar uns para os outros com cara de “então e agora?”. Merda feita, não havia muito que pudéssemos fazer para remediar. Ele pousou o poste no muro mais próximo e seguimos para minha casa. Até aqui nada de extraordinário. Feito o que íamos fazer a minha casa – não perguntem o quê que não me lembro – voltámos pelo mesmo caminho que tínhamos levado até à mesma. Qual não é o nosso espanto quando, ao passarmos perto da casa à qual o poste tinha ficado encostado ouvimos algo como “Vocês os quatro! Venham cá!”. Olhámos para trás e vimos um homem e, se não me engano, três mulheres a saírem da respetiva casa, sendo o homem o porta-voz. Lá nos aproximámos deles para ver o que queriam.
- Foram vocês que partiram este poste? – Não tendo sido eu o autor da obra mantive-me calado. Não sou chibo. Ficámos algum tempo a olhar uns para os outros até que o autor da obra de arte lá se acusou.
- Sim, fui eu.
- E porque é que o partiste?
- Oh, foi sem querer. Ia a salt…
- É, foi sem querer… eu sei bem o “sem querer” que foi. Também já tive a tua idade! A minha mãe – diz apontando para uma senhora com cara de coruja gorda, velha e rabugenta – viu da janela e viu bem que não foi sem querer! Brincadeiras parvas.
- Pois…
- Vá, vão lá mas que isto não se volte a repetir!
E lá fomos, todos acabrunhados dado o sermão que tínhamos acabado de levar. Claro que aquilo não ficou arrumado por ali. Fomos acabrunhados mas revoltados. Como putos que éramos não tivemos a ousadia de responder e tudo o que havia para dizer em nossa defesa ficou cativo apenas entre nós.
Agora passo a explicar tudo o que nos revoltou: Em primeiro lugar, a cobardia da velha coruja. Se tinha visto tudo a acontecer podia ter dito logo alguma coisa em vez de ir chamar o filho. Éramos putos e ela estava protegida pela própria casa. Não havia nada que pudéssemos fazer para retaliar. Em segundo lugar a comitiva toda que foi preciso para irem dar um raspanete a um bando de putos: a velha coruja, a irmã não tão velha mas também coruja, o filho e aquilo que penso ser a mulher do filho. A família toda para dizer a um puto tonto que ele não devia ter partido o poste… Como se isso fosse uma grande novidade.
Em terceiro a descriminação feita. Éramos um grupo de seis. Fomos chamados quatro. Porquê? Os restantes elementos do grupo eram raparigas… Se tinham visto o que tinha acontecido sabiam exatamente quem tinha sido o autor, ou seja, todo o teatro do “foram vocês que fizeram isso?” foi irritantemente direcionado apenas para os rapazes. Se queriam dar um raspanete a um grupo de adolescentes parvos e imaturos, davam a todos e não apenas aos rapazes. Quarto, a velha coruja viu e com certeza deve ter reparado que a intenção não era partir o poste. Bastava olhar para as nossas reações assim que o poste se partiu para perceber que sabíamos ter feito merda. Mas claro, é sempre mais giro optar pelo raspanete agressivo do que tentar perceber o que realmente aconteceu e tomar medidas adequadas consoante os factos.
E foi perante estes quatro fatores que as nossas cabeças adolescentes decidiram elaborar um plano de vingança. Não foi grande plano nem envolvia um grau muito elevado de intelecto, mas para nós serviu. Eu, o R e o J, sendo os mais vingativos, decidimos na noite de Halloween ir atirar ovos à respetiva casa. Para facilitar as coisas, um quarto – o M – ofereceu-se para providenciar os ovos, visto que o pai tinha galinhas e conseguia ovos à borla. Por motivos que não me recordo, o J acabou por não poder ir, ficando assim a missão entregue a mim, ao R e o M. E lá fomos. Um ovo em cada mão, passámos na casa, seis jardas espalhadas pela parede e pelas janelas e desatámos a correr e a rir, todos contentes com a proeza que tínhamos feito.
Eu não costumo ser rancoroso, mas isso se se tratar de alguém que eu goste e com quem lide diariamente. Este não era o caso e ter atirado ovos naquela noite não me chegou. Nem a mim nem aos meus dois companheiros de jornada. Onde é que eu quero chegar com isto? No ano a seguir repetimos a brincadeira. Também foi engraçado, também nos rimos muito, foi uma noite bem passada… Quer dizer, foi uma noite bem passada até eu estar já em casa e me tocarem à campainha. A partir daí deixou de ser bem passada.
Toca a campainha, e vai o meu pai ver quem é. Espreita pelo olho da porta e vê uma senhora com uma menina vestida a rigor para o dia em questão. Não querendo ter de dar doces (até porque não os tinha) agarrou na minha cadela – daquelas mansarronas que não fazia mal a ninguém mesmo que a provocassem, mas que era grande e que, para quem não a conhecesse, impunha algum respeito – e vai abrir a porta para tentar afugentar as potenciais pedintes de doces. Querem tentar adivinhar? Elas não iam pedir doces. Querem tentar adivinhar quem eram e o que iam fazer? Era a coruja menos velha e uma neta ou sobrinha neta ou uma porra qualquer, e iam fazer queixinhas. Pois é. A partir desse momento a noite não foi naaaaada bem passada. Nada.
Pelos vistos elas, uma vez mais, estavam à janela quando nós atirámos os ovos – há quem goste de ver televisão, estas senhoras preferem ver janela – e reconheceram-nos. Quer dizer, não nos reconheceram bem. Passo a explicar: Segundo a senhora, eu, o filho do estofador e um outro, tínhamos andado a atirar ovos à casa dela. Ora bem, “o filho do estofador” seria o J que, como eu já vos disse, não pôde ir. Quando eu disse “o J não estava lá” aconteceu aquilo que me fez ver que me podia ter safado apenas dizendo “não faço ideia do que é que está a falar”: Ela respondeu “Estás a tentar protege-lo porque ele é teu amigo mas eu bem o vi lá contigo a atirar ovos”. Ou seja, da mesma forma que ela “viu” lá o J também podia ter “visto” que era eu. Estava escuro e lá por elas parecerem duas corujas, não quer dizer que tenham a mesma capacidade de visão noturna das mesmas.
Como devem calcular, a noite não foi nada bonita depois dos meus pais descobrirem que eu tinha andado a atirar ovos à casa das vizinhas por dois anos consecutivos. Mas desenganem-se se acham que a história fica por aqui.
Chegado o terceiro Halloween a minha mãe disse-me “como já deves estar à espera este ano ficas em casa…”. E assim foi. Fiquei todo o serão em casa, sentado no sofá, com o pc no colo e os meus pais ao lado. Todos no mesmo sofá. Quero que percebam bem que eu estava sentado no mesmo sofá que os meus pais. Os dois. Acordados. O sofá nem é muito grande, ou seja, estávamos bem apertadinhos.
Essa noite passou tranquila e sem nada de entusiasmante para contar. A parte melhor foi o que aconteceu no dia a seguir, ou não muito longe disso. A senhora foi fazer queixa à minha avó de que não tinha servido de nada ter-se queixado aos meus pais e que naquele ano eu tinha ido fazer a mesma coisa. Segundo a coruja, foi falar com a minha avó porque a tinha como uma senhora decente. Isto porquê? Porque uma vez, a minha avó tinha tocado à campainha das corujas para lhes perguntar se podia tirar uma flor do quintal delas (mas que servia de enfeite ao muro, ou seja, dava para pegar a partir do passeio) em vez de tirar sem pedir autorização. Mas ainda bem que o fez! Se tivesse tirado sem pedir autorização, o mais certo era a coruja velha ter ido chamar o filho para dar um raspanete na minha avó. Bom, adiante. Estando a par da situação toda, a minha avó disse:
- Então mas ele esteve a noite toda em casa com os pais…
- Isso eles saem de casa que os pais nem dão por nada! Nem sabem onde é que eles andam.
- Desculpe, mas a minha filha disse-me que esteve o serão todo com ele e que ele não chegou a sair de casa.
- Então se não foi ele mandou os outros irem por ele!

E aqui recomeçamos uma nova análise de fatores que envolvem a situação: Ela viu que eu estava lá e tinha toda a certeza disso. Mas afinal já não. Mas mesmo que eu não estivesse lá, eu fui sempre a grande mente maquiavélica por trás de todos os ataques terroristas direcionados à sua habitação. E, quando me vi incapaz de liderar presencialmente os bombardeamentos, passei a liderá-los à distância, dando instruções exatas aos meus lacaios sobre o que fazer para melhor efetuarem a desova pelas paredes daquela fortaleza de câmaras de vigilância retro. Um verdadeiro senhor do crime, eu. Escusado será dizer que, após toda esta performance por parte da coruja menos velha, toda a gente ficou a perceber que elas não as regulavam todas…
Mas ainda não acabou! Uma das coisas que me foi imposta como castigo pelos meus pais – a mim e ao R – foi ir à porta das senhoras pedir desculpa e perguntar se queriam ajuda para limpar os ovos. Elas recusaram. Nós oferecemo-nos para ajudar a limpar-lhes as paredes da casa e elas recusaram! (verdade se diga que aquilo mal se notava que tinha levado com ovos. Na altura mais parecia uma casa assombrada…) Porque é que eu estou a fazer tanto enfase nesta questão? Porque, no ano que se seguiu a elas terem ido a minha casa fazer queixa, aconteceu o seguinte: eu passava naquele sítio todos os dias para ir e voltar da escola. E num desses dias olhei para a janela para ver se estava lá a coruja a tomar conta da rua. E estava. E oiço as palavras amorosas “Estás a olhar para a merda que fizeste?!”. Aquelas senhoras recusaram a nossa ajuda para limpar a casa mas não foi porque nos desculparam nem nada semelhante. Foi por algum motivo retorcido que eu prefiro nem imaginar. Perante tal pergunta a minha reação foi – pasmem-se! – rir-me. Não havia muito mais a fazer. E eis que vem uma segunda enxurrada de ódio “Estás-te a rir?! Qualquer dia levas um tiro!”. Como podem ver, estas senhoras destilam ódio perante qualquer um que passe perto da sua bela mansão.

Facto engraçado: Após 3 anos consecutivos a serem bombardeadas de ovos decidiram pintar a casa. Tiveram coragem. E sorte. Ao que parece ninguém voltou a atentar-lhes a casa com ovos.


Facto engraçado nº2: Pensando bem no assunto, não sei se não houve diospiros envolvidos num dos nossos ataques…

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