terça-feira, 10 de outubro de 2017

Ajudar não compensa...

Já alguma vez sentiram o diabo que há em vocês a transformar-se numa espécie de bebé chorão? Como assim? Eu explico. Na passada terça-feira dia 3, ia eu de carro a caminho do emprego (sim, eu trabalho…) quando, numa rua direita muito comprida, vejo alguém a esbardalhar-se à beira da estrada. Ainda longe, percebi que esse alguém levava alguma coisa na mão. Ora pois, sendo a besta que sou, a minha ordem de pensamento foi a seguinte: “eheh, deve ser um puto com uma bola na mão, não viu por onde ia e deu com os cornos no chão! É bem-feita que é para aprender a ver por onde anda!” Até aqui tudo normal. O problema começou no tempo que o “puto” estava a demorar a levantar-se. Algo não batia certo. Tal como já disse, a rua era comprida e, mesmo de carro, ainda demorei uns 7 ou 8 segundos a chegar ao locar do ocorrido – tempo mais que suficiente para um “puto” se levantar depois de uma queda. Foi aqui que os meus horrores apareceram. Não era um puto. Era uma velha. E aqui todo o meu sadismo desapareceu e deu lugar a pânico e preocupação. Quando lá cheguei a senhora ainda estava a tentar levantar-se. Parei o carro, abri a janela e – burro – perguntei duas vezes se precisava de ajuda, mas não obtive qualquer resposta. A pobre mulher estava mais preocupada em voltar a uma posição bípede do que a responder a um palhaço qualquer dentro do carro. Dada a falta de resposta, encostei o carro e fui tentar ajudar a senhora com a sua “bola” que afinal era um balde cheio de pão. Voltei a insistir se precisava de ajuda, mas, como qualquer velho que se preze, disse que não. Quando finalmente vi a cara da senhora senti-me num filme do Tarantino. Estava a deitar mais sangue da boca do que o Sweeney Todd deitou da garganta na cena final do filme.
Agarrei no balde de pão e ouvi as “justificações” da desgraçada:
- Ia a atravessar a estrada, vi um carro lá ao fundo (eu) e para não fazer esperar ninguém tropecei ali e caí! Mas eu vou para casa, é já ali.
- Mas precisa que a leve lá?
- Não, não. É já ali.
- Então deixe-me levar o balde.
- Não, deixe estar. Eu moro já ali.
- Mas eu levo o balde, escusa de estar a carregar este peso.
- OPÁ, NÃO! EU LEVO A MERDA DO BALDE!

Obviamente esta última frase é mentira. De facto, a senhora morava logo ali. (Entretanto, a caminho da casa da senhora, uma condutora pergunta-me do carro se eu já tinha chamado a ambulância, coisa que nunca mais me lembrei de fazer. Eu disse que não e pedi-lhe para o fazer. Ela, com uma cara de censura infernal, agarra no telemóvel e não sei se chamou a ambulância ou não que não fiquei lá para ver. Mais tarde voltaremos a este assunto)

- Está ali o meu marido, não precisa de se preocupar.
- Aquele senhor é o seu marido?
- É sim.
- Bom dia – dirigindo-me para o dito senhor – a sua mulher caiu e aleijou-se – meio a tentar que ele tomasse as rédeas do assunto.
- Atão como é que tu te arranjaste?! – dirigindo-se à esposa – Foi você que bateu? – dirigindo-se a mim.
- Não, não. Ninguém bateu. A senhora ia à beira da estrada e caiu.
- Ah mulher, andas sempre a olhar para aqui e para ali e nunca vês por onde andas! Vai-te lá limpar… – aqui eu fiquei sem saber o que fazer à vida. Eu todo contente a pensar que a senhora estava finalmente em boas mãos e o marido só não lhe bateu porque ela já tinha a cara feita num bolo.
De qualquer das formas fui dispensado pelos dois. De volta ao carro lá segui caminho para o trabalho.

Agora vem o processar dos acontecimentos na minha cabeça:
Quando o homem me perguntou se tinha sido eu a bater o meu cérebro nem sequer processou o que a pergunta realmente queria dizer. Ele estava a perguntar-me se tinha sido eu a atropelar a mulher. Depois desta epifania tive outra ainda pior. Ele pensava que eu tinha atropelado a mulher dele e mesmo assim estava a dar-lhe um raspanete à minha frente por se ter deixado atropelar… Eu fico parvo com o amor que algumas pessoas consegue segregar…
Voltando ao assunto da senhora condutora, também ela me deixou, a princípio, admirado com o ar de reprovação que me lançou. Afinal de contas eu tinha parado o carro para ajudar uma senhora que tinha caído, coisa que ela não fez. Limitou-se a ficar dentro do carro e perguntar-me se já tinha chamado a ambulância. Também aqui só depois é que me apercebi: Ela também deve ter ficado com a ideia que eu tinha atropelado a pobre mulher…


Moral da história: nunca ajudem ninguém que se tenha fodido por conta própria. É que depois os outros vão pensar que só estão a ajudar a pessoa porque foram vocês que a foderam.

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